segunda-feira, 21 de maio de 2012

A PRÁTICA DO CONTENTAMENTO - SANTOUCHA


SANTOUCHA

A PRÁTICA DO CONTENTAMENTO

Vivemos uma era marcada pela busca desenfreada pelo prazer, no entanto, uma  contagiante frustração acaba sendo sempre o resultado desta busca incessante que nos marca com uma visível expressão de descontentamento. Uma satisfação ilusória e momentânea é o máximo que um grande contingente de pessoas massificadas pelo consumismo conseguem atingir. A conquista de um tesouro desperta a ânsia de uma outra conquista ainda maior. Cada vez menos, as pessoas usufruem os recursos conquistados, pois o olhar está sempre além daquilo que se tem ou até mesmo daquilo que se pode ter. Há quem diga que esta postura move e incita o progresso, sendo portanto necessária à nossa evolução.
Santoucha, a prática do contentamento, vem frear este movimento desenfreado, pois tudo que não tem freio atinge uma velocidade perigosa capaz de gerar sérios acidentes. Nos ensina algo mais importante do que estarmos contentes; nos ensina, sobretudo, a sermos contentes. Há quem tema a prática do contentamento por atribuir a ela o ônus da acomodação. Uma sociedade acomodada geraria inércia e conseqüentes prejuízos à nossa evolução. Assim, Santoucha passa a ser um perigo que necessita ser evitado, pois o que move uma sociedade capitalista e consumista é a nossa esfomeada  insatisfação. Satisfeitos, consumimos menos fadando o capitalismo ao fracasso.
Parece que perdemos a consciência do que representa a palavra contentamento. Contentar-se, na ótica do princípio de Santoucha, é muito mais que estar satisfeito; é, na verdade, viver com satisfação.  A incapacidade para satisfazer-se traz grandes riscos para a vida e para a saúde. Por trás de vários distúrbios, esconde-se a nossa insatisfação que nos incita aos excessos. A obesidade, o alcoolismo, a dependência química, o estresse e uma série de outras patologias revelam claramente o nosso insaciável desejo. Na súplica do “Quero mais” nos excedemos e perdemos o discernimento, ou seja, a nossa capacidade de perceber a nossa saciedade e os nossos limites.  A ambição desenfreada que gera tantos desequilíbrios sociais e, consequentemente,  a violência revelam também a incapacidade do ser humano de viver e aceitar a distribuição equilibrada dos recursos. Querer toda a posse destes para si mesmo é uma atitude avarenta e comum em personalidades descontentes e insaciáveis.
Santoucha não pressupõe cruzar os braços adotando uma falsa satisfação geradora de uma acomodação patológica. Vivendo Santoucha, experenciamos,  profundamente, cada experiência permitindo-nos sentir, de fato, o sabor delas, bem como a importância e o significado destas em nossa vida. Antes de saborear, degustar, mastigar, engolir e digerir  valiosos alimentos que a vida nos oferece, nos viciamos em  cuspi-los  na ânsia de provar o próximo.  Provamos muita coisa e aprovamos muito pouco grande parte delas em função de nossa insatisfação de da ilusão que nos é vendida de que existe um outro produto  que nos trará a verdadeira satisfação. E, não existe verdadeira satisfação; existe a pura e simples satisfação. Adotamos uma atitude descartável para com as coisas e com as pessoas. Para os descontentes, tudo perde o valor assim que é conquistado. Quando finalmente conseguem o objeto, a pessoa ou a posição tão sonhada, antes mesmo de vivenciá-la já desejam e fantasiam uma outra conquista. Perdas, conflitos, dívidas, doenças, separações, crimes,  enfim, uma série de atrocidades são cometidas em razão deste descontentamento patológico.
O grande problema não é o “querer mais”, mas, sobretudo a incapacidade de valorizar o que se tem. A valorização gera a satisfação. Precisamos ter para com tudo que nos cerca a mesma relação que temos para com uma obra de arte – quanto mais antiga, mais valiosa. Ser antigo, neste contexto, não pressupõe ser velho, acabado, mas, ter uma história valiosa.  Na ótica capitalista, tudo que envelhece perde o valor. Perdendo o valor, desvalorizamos, criamos um descontentamento interno e miramos o nosso olhar em algo externo  a nós mesmos que possa nos vender a ilusória sensação de felicidade.
Santoucha não proíbe o desejo e o ter. É uma prática que nos leva um pouco além. É ter o que se deseja e desejar o que se tem. Na maioria das vezes, desejamos mais o que não temos do que aquilo que temos. Se perdemos o desejo por aquilo que temos, corremos o risco de perdermos as coisas mais valiosas de nossa vida. Santoucha não proíbe a busca e o encanto do encontro com aquilo que tanto lutamos por conquistar; nos ensina, sobretudo, a habilidade de fazer o encanto perdurar. Santoucha não proíbe a prosperidade; nos ensina a ultrapassar as nossas misérias. Santoucha não proíbe o prazer; é uma vacina contra o desprazer. Santoucha não nega a frustração, transforma-a. Enfim, Santoucha tira de nossa face a pesada e fechada expressão de insatisfação, substituindo-a por um sorriso constante e um intenso brilho no nosso olhar.



Um comentário: